MACIEL, Aline Mara Alves[2]
DORNELES, Claunice Maria[3]
RESUMO
O presente trabalho apresenta um olhar sobre a relação família e escola na educação do aluno com deficiência visual e as influências dessas relações no desenvolvimento da aprendizagem. Tem como pressupostos metodológicos a pesquisa qualitativa. Na coleta de dados, é utilizada a técnica de entrevistas semi-estruturadas. Os sujeitos elencados são pais e professores de alunos com deficiência visual – baixa visão matriculados na Rede Municipal de Ensino de Campo Grande- MS. Seu propósito é o de verificar a relação dos pais com a comunidade escolar, no tocante à aprendizagem de seus filhos com baixa visão, bem como o grau de comprometimento assumido, em nome de seus filhos, quanto ao atendimento educacional especializado, à acessibilidade e aos outros recursos pedagógicos dos quais seus filhos com deficiência visual tenham necessidade, em virtude de suas limitações visuais, e que deveriam ser oferecidos, de forma eqüitativa, pela escola a todos os seus alunos. O estudo feito pontua ainda o olhar do professor sobre esse processo que se faz por uma dialética sutil e imprescindível, tendo em vista uma proposta pedagógica inclusiva.
PALAVRAS-CHAVE: Aprendizagem. Deficiência visual. Família.
INTRODUÇÃO
Situações vividas diariamente nos levam a refletir sobre determinadas ações que se repetem no convívio social e, embora ocorram em tempos e lugares distintos e envolvam indivíduos também ímpares, produzem frustrações partilhadas por muitos, embora percebidas por poucos.
O presente estudo tem o propósito de verificar o envolvimento dos pais e a relação destes com a comunidade escolar, no tocante à aprendizagem de seus filhos com deficiência visual – baixa visão[4], tendo tido, para tanto, o apoio de uma metodologia quantitativa, já que dados foram coletados na Secretaria Municipal de Ensino de Campo Grande/ MS, no intuito de registrar o nº de alunos com deficiência visual e as escolas onde se inseriam estes alunos, e, sob a ótica da pesquisa qualitativa, foi feita a análise dos discursos de familiares - pais e educadores de alunos com deficiência visual- baixa visão, através de entrevistas semi-estruturadas, com especial atenção na busca da compreensão da importância ou não da participação das famílias no processo educacional inclusivo. Foi feita, ainda, uma investigação sobre o grau de comprometimento por elas assumido em nome de seus filhos com baixa visão, assim como os atendimentos educacionais especializados, acessibilidade e outros recursos pedagógicos dos quais seus filhos, com deficiência visual, tenham necessidade em virtude de suas limitações visuais. Sabe-se que, legalmente, tais recursos devem ser oferecidos de forma eqüitativa pela escola a todos os seus alunos. Assim, uma proposta pedagógica inclusiva deve ter como questão norteadora as seguintes indagações: como os familiares – pais normovisuais[5] – se relacionam com um filho com deficiência visual? Que impactos essas relações, seus aspectos qualitativos e suas influências exercem no desenvolvimento da aprendizagem?
Na busca de compreender o conceito de inclusão escolar, utilizamos o que preconiza a Declaração de Salamanca, UNESCO (1994):
Principio fundamental da escola inclusiva é o de que todas as crianças devem aprender juntas, sempre que possível, independentemente de quaisquer dificuldades ou diferenças que elas possam ter. Escolas inclusivas devem reconhecer e responder às necessidades diversas de seus alunos, acomodando ambos os estilos e ritmos de aprendizagem e assegurando uma educação de qualidade a todos através de um currículo apropriado, arranjos organizacionais, estratégias de ensino, uso de recurso e parceria com as comunidades. Na verdade, deveria existir uma continuidade de serviços e apoio proporcional ao contínuo de necessidades especiais encontradas dentro da escola. (UNESCO, 1994, p.11).
Para tanto, como já ficou registrado anteriormente, foi feita, a princípio, um breve levantamento dos alunos com deficiência visual - baixa visão, inseridos na Rede Municipal de Educação –REME, do município de Campo Grande - MS, bem como a concepção dos seus pais em relação ao filho com deficiência visual Também foi levada em conta a postura do professor frente ao interesse ou desinteresse, participação ou não participação da família no processo de aprendizagem do aluno com deficiência visual – baixa visão e, finalmente, as influências de suas atitudes, como indiferença ou super-proteção, para o desenvolvimento educacional e sócio-afetivo do aluno com deficiência visual frente à inclusão escolar.
Sendo assim, para a fundamentação deste trabalho, encontramos aporte nos seguintes teóricos: Mantoan, (2000); Dorneles, (2007); Massini, (2004); envolvendo o tema sobre a inclusão e escola inclusiva. Já as concepções teóricas de Soifer, (1989); Amirallian, (1986) e Buscaglia (2002) foram imprescindíveis para a compreensão do conceito de família e de suas ralações com o assunto a ser tratado.
Os temas abordados foram estruturados em sete itens para facilitar a leitura e torná-la mais dinâmica. São eles: 1. Educação da pessoa com deficiência visual: breve histórico e considerações. 2. A família: parceira no processo de aprendizagem e desenvolvimento do aluno baixa visão. 3. Contribuições da escola inclusiva para a aprendizagem do aluno baixa visão. 4. Pressupostos metodológicos. 5. Apresentação, caracterização dos sujeitos-alvo e análise dos dados; 6 - Considerações finais. Alguns desses itens, por sua vez, foram organizados em subitens, como se verá a seguir.
1- EDUCAÇÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA VISUAL: BREVE HISTÓRICO E CONSIDERAÇÕES.
A história das pessoas com deficiência visual na humanidade é comum a todas deficiências: inicialmente eram excluídas, porém no decorrer dos tempos, os conceitos foram evoluindo conforme as crenças, valores culturais, concepção de homem e transformações sociais que ocorreram ou ocorrem nos diferentes momentos históricos.
As preocupações de cunho educacional em relação às pessoas cegas surgiram no século XVI, com Girolano Cardono – médico italiano – que testou a possibilidade de algum aprendizado de leitura através do tato. Peter Pontamos Fleming, ele próprio cego, e o padre Lara Terzi escreveram os primeiros livros sobre a educação das pessoas cegas. (Bruno & Mota, 2001).
A partir de então, as idéias difundidas vão ganhando força até que no século XVIII, surge em Paris a primeira escola para cegos. Nela, Hauy exercita sua invenção – um sistema de leitura em alto relevo com letras em caracteres comuns.
No século XIX, proliferaram, na Europa e nos Estados Unidos, escolas com a mesma proposta educacional. O novo sistema com caracteres e relevo para escrita e leitura de cegos é desenvolvido por Louis Braille e tomado público em 1825: o Sistema Braille. Assim, o processo de ensino-aprendizagem das pessoas cegas deslancha, possibilitando-lhes maior integração social.
No Brasil, a preocupação com a educação da pessoa com deficiência visual ocorreu no Segundo Império, precisamente em 1854, com a criação do Imperial Instituto dos Meninos Cegos, posteriormente denominado Instituto Nacional dos Cegos e, a partir de 24 de janeiro de 1891, mudou o seu nome, mantido até os dias atuais, para Instituto Benjamim Constant (IBC), sendo esta a única Instituição Federal no território brasileiro e também a primeira na América Latina destinada a promover a educação de pessoas cegas iniciada num período em que a pessoa com baixa visão não recebia qualquer atendimento especializado.
O Instituto referendado no parágrafo anterior também foi o responsável pela implantação da primeira Imprensa Braille do país (1926), tendo seu trabalho voltado à capacitação de recursos humanos, às publicações científicas e à inserção de pessoas deficientes visuais no mercado de trabalho.
Outro marco importante na história da educação de pessoas cegas foi a criação, em 1946, da Fundação para o Livro do Cego no Brasil, hoje denominada Fundação Dorina Nowill para Cegos que, com o objetivo original de divulgar livros do Sistema Braille, alargou sua área de atuação, apresentando-se como pioneira na defesa do ensino integrado, prestando relevantes serviços na capacitação de recursos humanos e no ensino de práticas pedagógicas especializadas para o atendimento de pessoas cegas.
Já em âmbito regional, com a proposta de descentralização da educação das pessoas com deficiência visual, segundo DORNELES, (2007), “[...] em Mato Grosso do Sul, a educação especializada para o deficiente visual teve inicio com a instituição filantrópica Instituto Mato- Grossense para Cegos (IMC), atual Instituto Sul- Mato-Grossense para Cegos Florivaldo Vargas (ISMAC).” (DORNELES, 2007. p. 27).
Ainda de acordo com a autora, o oferecimento de curso de formação de professores especializados para a educação formal de deficientes visuais, pelo Instituto de Educação Caetano de Campos em São Paulo, viabilizou o ingresso de profissional do IMC, que ao retornar, trouxe uma inovadora proposta para a época:
Uma proposta educacional voltada à integração do deficiente visual ao ensino regular com apoio de salas de recurso. Tal sala consistia num ambiente equipado para atender ao deficiente visual, contando com professor de educação especial [..] o atendimento que o professor especializado presta indo até a escola em que o deficiente visual está integrado, proporcionando suporte pedagógico ao aluno e aos professores. (Ibid. p.28).
Na perspectiva atual, as pessoas com deficiência visual estão incluídas no ensino regular com apoio dos serviços especializados denominados salas de recursos- multifuncionais[6] que têm por finalidade a complementação e suplementação especializada aos alunos com deficiência visual oficialmente matriculados no ensino regular. Contudo, para que haja sucesso no desenvolver desse trabalho pedagógico, se fazem necessários, e em muitos casos, imprescindíveis, a participação e o envolvimento da família.
2 A FAMILIA: PARCEIRA NO PROCESSO DE APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO DO ALUNO BAIXA VISÃO
Estudos sobre a aprendizagem da criança com baixa visão tiveram início com as pesquisas realizadas, por certo período de tempo, pela professora Natalie Barraga, com dez pares de crianças com visão remanescente e idades entre seis e treze anos. Barraga foi a primeira pesquisadora “[...] a levantar a hipótese de que as pessoas, consideradas cegas, poderiam ter, ainda assim, uma visão residual [...] (Dall’Acqua, 2001. p. 70 -191)
Em 1964, são apresentadas as primeiras conclusões das investigações empreendidas por Barraga em relação aos portadores de problemas relacionados à visão que, até então, eram classificados em duas categorias: os normais e os cegos ou deficientes visuais. Após o trabalho iniciado por ela, o conceito de deficiente visual passou a não mais se referir às pessoas genericamente educadas como cegas, mas sim àquelas que apresentam restrição total ou diminuição da capacidade visual. Assim, o termo “visão subnormal”, definido por Barraga, foi introduzido pela primeira vez, em 1978, na nona edição da Classificação Internacional de Doenças, hoje também definido convencionalmente como baixa visão.
Crianças com deficiência visual – baixa visão – podem apresentar ainda atraso no desenvolvimento global. Isto se deve em grande parte à dificuldade de interação, apreensão, exploração e domínio do meio físico.
Essas experiências significativas são responsáveis pela decodificação e interpretação do mundo pelas vias sensoriais remanescentes (táteis, auditivas, olfativas e gustativas). A falta dessas experiências pode prejudicar a compreensão das relações espaciais, temporais e a aquisição de conceitos necessários ao processo de aprendizagem; tais experiências podem ser propiciadas, inicialmente, no ambiente familiar, e ampliadas, posteriormente, no contexto escolar.
Intermediária entre o indivíduo e a sociedade é a família, que oportuniza ao indivíduo aprender a perceber o mundo e situar-se nele, passando constantemente por processos de negociações. Ela não é, portanto, algo natural, biológico, mas sim uma instituição social que se constitui de maneiras diversas em ocasiões e tempos, para responder às necessidades sociais.
O grupo familiar contribui com a evolução do indivíduo deficiente, quando persiste e acredita que este, se estimulado, pode se desenvolver dentro de suas capacidades. Em relação ao papel da família neste contexto, BUSCAGLIA (2002) propõe:
[...] esta pode atuar de uma forma bastante positiva como mediadora entre a sociedade em que seu filho terá de viver e o ambiente mais consciente e receptivo que ela pode lhe oferecer (...) cada membro da família deve adaptar seus próprios sentimentos em relação à deficiência (...) só assim a criança ajustará seus sentimentos em relação à própria deficiência e por fim a si mesma, como uma pessoa completa. (BUSCAGLIA (2002, p. 90)
Pode-se afirmar, então, que a participação da família é fundamental, tanto para a criança normal como para a deficiente, pois irá transmitir os valores positivos ou negativos que esta deve seguir. Assim, uma constituição saudável de família é primordial para que a criança construa uma auto-imagem positiva. O processo de inclusão de qualquer tipo de deficiência requer um trabalho conjunto entre familiares e professores, conscientes de suas intervenções. Para SOIFER, (1989), “[...] a função institucional da família é servir de reservatório, controle e segurança para a satisfação da parte mais imatura ou primitiva, da personalidade (SOIFER,1989. p.22)”.
Por pertencer a um mundo objetivamente visual, a família, muitas vezes, não sabe como lidar com a criança com baixa visão. Para os familiares, ela se torna um verdadeiro quebra-cabeça. Além disso, os pais, consciente ou inconscientemente, desejam que seus filhos pareçam “normais”. Desta forma, a criança com deficiência visual, “protegida” ou “negligenciada,” fica impedida de explorar, experimentar, testar suas capacidades e seus limites na aprendizagem visual, acarretando prejuízos em seu desenvolvimento global.Quanto a isso, AMIRALIAN (1986) afirma:
O cerne dos problemas psicológicos que afligem o indivíduo excepcional se relaciona com a formação do auto-conceito, a incongruência que cotidianamente se lhe apresenta entre o Eu real e o Eu ideal, é bastante lógica, pois nossa sociedade estar organizada para os sujeitos física, intelectual e sócio-emocionalmente perfeitos, na qual o excepcional não encontra lugar (AMIRALIAN, 1986, p.169).
O inegável impacto emocional e social da deficiência, no sistema familiar, constituem elemento relativamente novo, no que tange a estudos científicos, haja vista a transacionalidade da estrutura familiar que acompanha os movimentos socioeconômicos e culturais de cada época, apesar de ser esta a responsável pela formação da pessoa e a construção do ser, além de ter a responsabilidade de formar o caráter, de educar para os desafios da vida, de perpetuar valores éticos e morais, pois o ambiente sócio-familiar vai influenciar sua forma de agir e de ser, determinando o seu desempenho sócio-emocional.
Portanto, trabalhar com o deficiente visual subentende-se o dever de trabalhar concomitantemente o seu núcleo familiar. É preciso sensibilizar a família, para que esta atente não somente para as condições ambientais físicas que envolvem o deficiente, mas também para o ambiente emocional, enfim para seu contexto biopsicossocial, para a importância do cuidado com cada momento do desenvolvimento e descobertas deste deficiente visual. Família integrada significa pessoas mais funcionais, felizes, autoconfiantes e mais integradas à sociedade. Convergente com esses ideários, para Omote (1980 apud MASINI:
O atendimento à família do deficiente deve pautar-se por uma perspectiva dupla: a de prover condições favoráveis para o desenvolvimento da criança e a de auxiliar cada família a enfrentar as dificuldades decorrentes de sua condição [...]. (Omote, 1980 apud MASINI, 2004, p.146)
É, portanto, necessário envolver essas famílias e criar momentos para que essa energia psíquica possa fluir e ajudar no entendimento e resolução de conflitos.
3 CONTRIBUIÇÕES DA ESCOLA INCLUSIVA PARA A APRENDIZAGEM DO ALUNO BAIXA VISÃO
Aqui, entendemos aprendizagem tal qual propõe DORNELES, (2007) “[ ...] como processo de amalgamação das informações e das habilidades humanas [...]”. Portanto, tornar a aprendizagem significativa e despertar o interesse em aprender são funções básicas dos recursos didáticos, sejam eles pessoais e ou materiais, pois são eles que contribuem para que o universo e a escola sejam mais acessíveis a todos.
O paradigma da construção de sistemas educacionais inclusivos em desenvolvimento requer relações interpessoais que sejam eficientemente acolhedoras para todos, ou seja, que atendam às necessidades educacionais de todos, inclusive dos que apresentam alguma deficiência.Assim sendo, concordamos com MANTOAN (2000) quando afirma:
Para que as escolas sejam verdadeiramente inclusivas, ou seja, abertas à diversidade, há que se reverter o modo de pensar e de fazer educação nas salas de aula, de planejar e de avaliar o ensino e de formar e aperfeiçoar o professor, especialmente os que atuam no Ensino Fundamental. Entre outras inovações, a inclusão implica também uma outra fusão, a do ensino regular com o especial e em opções alternativas/aumentativas da qualidade de ensino para os aprendizes em geral (MANTOAN, 2000. pp.55-60).
A escola se torna inclusiva à medida que reconhece a diversidade que constitui seu alunado e a ela responde com eficiência pedagógica.
Para responder às necessidades educacionais de cada aluno, condição essencial na prática educacional inclusiva, há que se adequar os diferentes elementos curriculares, quer sejam materiais, quer sejam pessoais, de forma a atender as peculiaridades de cada um e de todos os alunos. Este momento histórico da realidade brasileira aspira por um avanço na direção da construção de um sistema educacional inclusivo que cumpra efetivamente com o objetivo proposto pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996): “[...] os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com necessidades especiais: currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização específicos, para atender às suas necessidades” (LDB, 1996. Art. 59. I).
Os alunos com deficiência visual possuem grandes possibilidades de desenvolvimento pessoal e intelectual desde que lhes sejam oferecidas oportunidades de aprendizagem que utilizam metodologias e recursos didáticos adequados a sua forma de perceber e sentir o meio em que vivem.
4 PRESSUPOSTOS METODOLÓGICOS
4.1 PROBLEMA A SER INVESTIGADO
Atuando como professora na Rede Municipal de Ensino, em Campo Grande, MS, tenho enfrentado e também observado, no discurso de meus colegas professores, algumas dificuldades no tocante à aprendizagem dos alunos deficientes visuais – baixa visão. Tais dificuldades são atribuídas, segundo os professores, à indiferença dos pais em relação ao desenvolvimento educacional de seus filhos com deficiência visual, à falta de atenção oferecida pela família a essas crianças e ao despreparo dos professores frente a esse novo desafio: o da educação inclusiva.
Esse foi o contexto que despertou nosso interesse e inspirou o desenvolvimento desta pesquisa, que pretende apresentar dados coletados no ambiente familiar, a partir de entrevistas semi- estruturadas, realizadas com duas famílias em cujo seio há crianças com baixa visão e que freqüentam a escola comum nos anos iniciais do Ensino Fundamental da Rede Municipal de Ensino (REME), em Campo Grande – MS, a fim de compreender como os familiares- pais normovisuais5 - se relacionam com um filho com deficiência visual e que impactos essas relações, seus aspectos qualitativos e suas influências exercem no desenvolvimento da aprendizagem.
Essas foram, portanto, as questões norteadoras deste processo investigativo, sem ter a pretensão de analisar a didática aplicada ao ensino do deficiente baixa visual- baixa visão e tão pouco emitir conceitos sobre a dinâmica familiar, mas apenas voltar a atenção, de forma bidimensional, para as questões referentes ao olhar do professor em relação ao envolvimento da família no desenvolvimento da aprendizagem do aluno com baixa- visão e, conseqüentemente, da família em relação ao comprometimento do professor e da unidade escolar em sua totalidade para transformar em ação o discurso da educação inclusiva.
4.2 PESQUISA QUALITATIVA
A pesquisa qualitativa tem sido um dos recursos mais utilizados por constituir rica fonte de interação entre o pesquisador e o objeto a ser observado. Além de ser direcionado e não se ater a dados estatísticos, seu foco de interesse é amplo e procura entender os fenômenos a partir da perspectiva dos participantes da situação estudada. Sobre a pesquisa qualitativa, tomamos como referência o parecer de GODOY (1995):
Ambiente natural como fonte direta de dados e o pesquisador como instrumento fundamental; caráter descritivo; significado que as pessoas dão às coisas e à vida como preocupação do investigador; enfoque indutivo. (GODOY, 1995. p. 62).
Por tanto, constitui um conjunto de diferentes técnicas que visam descrever e decodificar o componente de um sistema complexo de significados. O desenvolvimento de um estudo de pesquisa qualitativa supõe um corte temporal-espacial por parte do pesquisador; esse corte define o campo e a dimensão em que o trabalho há de se desenvolver.
4.3 PESQUISA QUANTITATIVA
No presente estudo, a abordagem metodológica de caráter quantitativo se deu por meio de uma coleta e registro de dados obtidos na Secretaria Municipal de Educação de Campo Grande, a respeito do número de escolas que possuem, em seu quadro discente, alunos com problemas de visão, tendo sido identificadas cerca de 32 escolas em Campo Grande. Dessas, foram selecionadas duas para se proceder às entrevistas semi-estruturadas, de caráter qualitativo, com os professores e as famílias de alunos com deficiência visual. Assim, se reconhece que neste estudo também ocorreu, mesmo que de forma simplista, uma abordagem metodológica quantitativa, já que houve a coleta de informações objetivas, dentro de uma visão realista, sem que houvesse nossa interferência ou a do sujeito pesquisado.
4.4 PRECEDIMENTOS E COLETA DE DADOS
Após a coleta de informações objetivas junto à Secretaria Municipal de Educação, e a seleção de duas escolas para a aplicação de uma pesquisa qualitativa, procedeu-se à realização das entrevistas semi – estruturadas, que de acordo com Triviños (1987):
É aquela que parte de certos questionamentos básicos, apoiados em teorias e hipóteses que interessam à pesquisa, pois ao mesmo tempo em que valoriza a presença do investigador, oferece todas as perspectivas possíveis para que o informante alcance a liberdade e a espontaneidade necessárias, enriquecendo a investigação. (TRIVIÑOS,1987.p. 146)
Assim, o instrumento da entrevista foi elaborado contendo dez temas geradores, tidos como essenciais, dos quais cinco foram respondidos pelas professoras e os outros cinco pelas mães. Contudo, percebeu- se, no andamento das entrevistas, a necessidade de reorganizá- los, para que a coleta das informações não ficasse comprometida com respostas fechadas.
Fizemos visitas domiciliares às famílias e, com auxilio de um gravador, realizamos a gravação das questões que consideramos representar um embrião a tomar forma no discorrer dos diálogos, já que nosso intento era apenas introduzir o assunto e estimular a participação espontânea dos entrevistados.
Após as entrevistas com os pais, no segundo momento, procuramos conduzir as entrevistas com as professoras, porém o contato pessoal com elas se deu nas escolas onde atuam e em seus respectivos horários de planejamento.
5- APRESENTAÇÃO, CARACTERIZAÇÃO DOS SUJEITOS-ALVO E ANÁLISE DOS RESULTADOS
5.1 CAMPO EMPÍRICO
Inicialmente, fizemos uma busca junto à SEMED – Campo Grande, MS, para obter a relação das escolas do município com alunos deficientes visuais – baixa visão. Essa informação foi disponibilizada pela equipe da Divisão de Educação Especial da REME.
Após obter a relação das trinta e duas (32) escolas da REME com alunos com deficiência visual- baixa visão, tivemos o cuidado de, inicialmente, selecionar duas escolas, as quais contatamos para verificar a disposição da direção e das professoras em contribuir com nossa pesquisa. Nesse primeiro momento, o processo de seleção das escolas teve como critérios a proximidade entre elas e a diversidade de seu alunado, pois a escola I (E.M.S.S.O), localiza- se na periferia da cidade e foi criada, inicialmente, para atender as crianças indígenas que vivem na aldeia urbana Marçal de Souza, onde se situa a escola, tendo contudo disponibilizado significativo número de vagas a todas as crianças da região. Já a escola II (E.M.A) foi selecionada por ter um alunado diverso ao da anterior, já que por sua localização privilegiada e pela estrutura física é preferencial entre as famílias da região que apresentam uma condição socioeconômica mais elevada.
Entretanto, não foi possível realizar a pesquisa de campo com esta segunda escola, pois o aluno baixa- visão, lá matriculado, freqüenta o 6º ano do Ensino Fundamental e nossa proposta era o de analisar o contexto dos alunos baixa visão dos anos iniciais.
Superado esse desafio inicial, partimos na busca de outra instituição que tivesse o mesmo perfil da segunda escola acima citada. Entramos em contato com a escola III (E.M.G.C), já que de acordo com as informações de uma das professoras que trabalha lá, essa escola tem significativa participação dos pais de seus alunos, principalmente daqueles cujos filhos têm deficiência visual. Segundo o relato da professora, seu alunado é economicamente bem favorecido, a unidade escolar bastante “tradicional” na cidade e fica localizada no bairro Vila Castelo, na região central de Campo Grande/MS. Apesar de, a princípio, a diretora parecer disposta a cooperar com a pesquisa, constatamos, posteriormente, não ser viável nosso trabalho naquela unidade escolar, uma vez que, ao verificar o roteiro de entrevistas que seria desenvolvido, a diretora sugeriu que o transformássemos em um questionário escrito a ser respondido pela professora sem a nossa presença; do mesmo modo, sugeriu tal procedimento a ser desenvolvido com os pais; Também, faz-se necessário registrar que, em momento algum, nos foi permitido contato direto com a professora que deveria ser entrevistada durante o desenvolver do processo investigativo.
Assim sendo, concluímos que seria mais viável escolher, mais uma vez, outra unidade escolar para efetivar nosso trabalho, já que as modificações sugeridas pela referendada diretora feriam os princípios fundamentais que pautam o desenvolvimento deste trabalho: a pesquisa qualitativa que tem como enfoque a interação entre o pesquisador e os sujeitos pesquisados.
Retomamos então nossa busca e como já não havia opções de escola cujo perfil se assemelhasse à segunda escola de nossa escolha, decidimos verificar outra instituição escolar de periferia, onde houvesse possibilidade de darmos andamento à nossa pesquisa.
Contatamos, assim, a escola IV (E.M.A.J.P), localizada em região periférica da cidade, mais precisamente no bairro Jardim Itamaracá, onde tomamos conhecimento de haver três irmãos com deficiência visual – baixa visão, freqüentado o 2º, 3º e 4º anos iniciais do período matutino. Tal estabelecimento se tornou assim identificado como escola II, apesar de ter sido a 4ª escola onde se tentou realizar a pesquisa.
Ao falarmos de nossa proposta investigativa, fomos prontamente acolhidos e recebemos, não só por parte da direção, mas também da equipe de supervisores e dos professores, palavras de estímulo e agradecimento pela escolha daquela escola.
Superado esse primeiro estágio de dificuldades, teve inicio o processo de contato com as famílias a serem entrevistadas, o qual se fez por intermédio das escolas que, inicialmente, comunicaram às famílias sobre o trabalho a ser desenvolvido e, com a resposta afirmativa destas, foi permitido que fizéssemos o contato pessoal, a princípio via telefone e, posteriormente, em visitas domiciliares.
5.2 SELEÇÃO E CARACTERIZAÇÃO DOS SUJEITOS
Das famílias mencionadas, foram escolhidas duas mães, aqui identificadas pelas letras iniciais de seus nomes, e das escolas selecionadas; duas professoras também foram identificadas pelas iniciais dos respectivos nomes para preservar suas identidades.
Para melhor compreensão e organização das informações, faremos menção das escolas tal qual se fez no subitem 5.1 (escola I, escola II) e para referendar os respectivos professores e as mães, utilizaremos o mesmo critério, ficando, portanto, subentendido que o professor I é atuante na escola I, a e mãe I tem o filho matriculado na escola I; o mesmo se dará para registro da outra escola.
Mãe I: M.R.B- Tem 27 anos, é solteira, tem três filhos, mora com a mãe, seus três filhos, sobrinhos e uma irmã; não possui renda fixa e é de baixa escolaridade.
Professora I: M.I.S.- Graduada em artes e magistério, leciona há 17 anos; atualmente, leciona para uma turma de 4º ano no período vespertino
Mãe II: J.M.S.- 27 anos, três filhos, casada, reside com o marido e os filhos, possui renda fixa e nível de escolaridade médio.
Professora II: L.E.C.- Graduada em pedagogia pela UFMS, curso profissionalizante magistério, especialização em alfabetização. Leciona na REME, E.M.A.J.P. para turmas de 4º ano.
5.3 ANÁLISE DOS RESULTADOS
5.3.1 Universo: Professores
Foram propostos dez temas geradores para conduzir os diálogos com os sujeitos pesquisados. No andamento da prática, houve, porém, algumas mudanças de nuances. Contudo, conseguimos manter a vértebra de nossas indagações: a relação família ↔ escola na educação do aluno com deficiência visual e as influências dessas relações no desenvolvimento da aprendizagem.
Os primeiros cinco temas enfocaram o professor e sua relação com o aluno e com a família; os outros cinco temas pontuaram o olhar da família em relação à escola e ao processo de aprendizagem do filho.
O tema 1 trata do olhar e da prática pedagógica do professor; o 2 diz respeito a recursos utilizáveis; já no 3 introduzimos a família, para sondar sua participação no processo de aprendizagem. O tema 4 refere- se ao contato da família com o professor e no 5 tratamos de indagar qual seria, do ponto de vista do professor, o ambiente ideal de aprendizagem para um aluno com baixa visão.
Quanto ao tema 1-o olhar e a práxis pedagógica, houve unanimidade entre os professores quanto à necessidade de aplicar atividades diferenciadas e também quanto ao fato de os alunos baixa visão não acompanharem a turma nas atividades diárias, porém algo para nós não ficou muito claro: a concepção de ambas as professoras no tocante a atividades diferenciadas e trabalho diferenciado. Essa falta de clareza pode ser depreendida pelas palavras das entrevistadas: Professora I – “Eu tenho que trabalhar as atividades com o mesmo conteúdo dos outros, a diferença é que eu amplio as atividades dele” (aluno deficiente visual) . Professora II – “Eu trabalho com ele (aluno) diferenciado da turma, enquanto a turma está em atividade, ele está fazendo atividade diferente da turma, porque ele não é alfabetizado... Quanto a isso a Declaração de Salamanca (UNESCO, 1994) afirma que escolas inclusivas devem: “ [..] reconhecer e responder às necessidades diversas de seus alunos, acomodando ambos os estilos e ritmos de aprendizagem [...]”.
Com relação aos recursos, assunto abordado no (tema 2), nota- se no discurso que a Professora I não tem muita clareza quanto aos recursos disponíveis, tão pouco faz menção deles em sua fala: “ (...) a outra professora me entregou.....uma..... eu não sei o nome do tabuleirozinho, onde tinha um apoio de caderno, né ? pra ele pôr o caderno, o livro...”, já no discurso da Professora II, nota- se que alguns recursos são uma rotina na prática da professora, sem os quais, seu trabalho seria inviável: “(...) eu utilizo a lupa..... que aumenta pra ele....pra.....pra facilitar a visualização .... eu trabalho com fichas de sílabas e o alfabeto móvel ...”. Ainda recorrendo a Salamanca:
Devem utilizar-se os recursos técnicos adequados que forem acessíveis sempre que se justificar o seu uso para promover o sucesso educativo, no contexto do currículo escolar, e para ajudar a comunicação, a mobilidade e aprendizagem. (Ibid,p.23).
Quanto à participação da família, (tema 3), em ambas as Professoras, I e II, percebemos, pelos seus depoimentos, que as mesmas não interpretaram bem o preceito “ações para envolvimento da família”, fato que se pode constatar na leitura do discurso da Professora I, quando afirma: “(....) a escola em si .....às vezes promove......., algum evento, alguma coisinha assim ....”., portanto parece não fazer parte da prática das professoras, pois em ambos os casos elas “confundem” essa ação com as “tarefas para casa”, notamos que para tal ação faz- se necessário um envolvimento maior da escola como um todo e principalmente da gestão, concernente a isso temos:
[...] os diretores dos estabelecimentos de ensino poderão contribuir de forma significativa para tornar as escolas mais adequadas às crianças [...] e a desenvolver estreitas relações com os pais e com a comunidade. (Ibid,23)
Sobre o contato com a família e recepção da escola, fica claro, em ambos os discursos, que a prática adotada pela escola para recepcionar os pais ocorre com horários pré agendados: o do planejamento do professor; registrou-se, porém, que, segundo os depoimentos, a informação de que até aquele momento, (o da entrevista), as professoras supra citadas não haviam tido nenhum contato pessoal com essas famílias: Professora I : “(...) - eu não conheço a mãe, eu não conheço a família e ....... nunca vieram conversar comigo .....”. Professora II: “(...) inclusive eu já convoquei a mãe duas ou três vezes pra gente conversar sobre os avanços do aluno ..... mas ainda não tive nenhum retorno da família, nem na reunião de pais de entrega de notas a mãe compareceu....”..
Ao perguntarmos às professoras qual seria o ambiente ideal de aprendizagem para alunos com deficiência visual, (tema 5), tanto num como noutro discurso ficou claro que os recursos materiais, como livros ampliados, iluminação propícia, quadro adequado e os recursos pessoais, sem dúvida impulsionariam o fazer pedagógico dessas professoras: Professora I: “(...) O importante é a capacitação, né,? porque com a capacitação você vai saber propiciar também ambiente melhor de sala de aula......”. Professora II: “(...) eu acho que o material adaptado, o livro adaptado, facilitaria bastante pro professor e pro aluno...”. Reforçamos o discurso das professoras: “A preparação adequada de todo o pessoal educativo constitui o fator- chave na promoção das escolas inclusivas [...]”. (Ibid, p.27).
5.3.2 Universo: Mães
Nossa intenção, inicialmente, foi visualizar, por meio dos cinco temas geradores, as opiniões das entrevistadas e do ambiente onde vivem suas famílias: 1-como se dão as relações mãe x filho baixa visão; 2-filho baixa visão x sociedade; 3- família x escola; 4-a qualidade dessas relações, e 5- a expectativa da família em relação à aprendizagem da criança baixa visão.
Ao indagarmos sobre como é ter uma criança com deficiência visual, ambas as mães disseram não terem tido muita dificuldade de aceitação e de adaptação. Mãe I: “ Assim.... pra mim, graças a Deus, não foi poblema (sic) né, ? porque....Deus é bom, graças a Deus, nunca deixou faltar nada.... agora, assim.... é dificultoso porque eu tenho que ta (sic) levando ele no ISMAC, tenho que tá (sic) levando ele no oftamologista” (sic),....; Mãe II: “- Normal.....”.Contudo, os relatos se dão sem entusiasmo e reforçado pelo excesso de cuidados que a criança exige, o que pode caracterizar o conceito de negação e contribuir para a formação de um auto-conceito negativo e sobre isso, MASINI (2007) afirma:
[...] a negação da existência do outro, que ocorre quando alguém reage ao outro sem entusiasmo, com frieza ou tangencialmente. A negação pode ser mais ou menos destrutiva, dependendo das circunstancias e das pessoas envolvidas [...] MASINI (2007 p.28).
Quanto à relação do filho com a sociedade, houve comentários sobre o fato de que em alguns momentos a criança havia sofrido preconceito e aconteceu, surpreendentemente, no ambiente escolar: Mãe I: “(...) no começo do ano, quando começou as aulas, né,? aí ele falou que sempre tinha um menino lá na escola que ficava chamando ele de cego...” Mãe II: “Entre os irmãos é bate pra lá, bate pra cá....Eu.... imponho respeito, meu marido também.... normal...”
Sobre a relação da família com a escola e a qualidade dessa relação, o resultado pontuou a existência de pouca afinidade: Mãe I: “(...) - eu não posso ta (sic) falando assim, chegar e conversar na escola né,?, lá não é permitido, no momento que eu chegar e falar com eles, e....... teve uma vez que marcaram pra mim, só que eu não pude ir ...” Mãe II: “(...) Tooooda semana (a escola) ta (sic) chamando,...(risos)....... toooda semana, mas, assim conforme eu posso eu vou, se eu não puder eu não vou, porque mais ou menos eu sei pra que que vão me chamá(sic)....... aí ... mais ou menos eu sei o que que eu vou fazer o que não não vou fazer, já converso com eles antes, é assim... conforme vou podendo eu vou.”. Essa relação pouco estreita entre família e escola, poderia ser re-estabelecida se a escola compreender que não é um mero expectador/observador do sistema familiar, por sua posição de “poder” pelo “saber”, tão comum aos especialistas nas áreas de saúde e educação.
O “saber” é compartilhado e o profissional é um agente atuante, parte integrante do sistema, utilizando suas crenças, sua visão de mundo para construir com a família um espaço de conversação e negociação dialógica [...] (Ibid, p. 140)
Em relação às expectativas de aprendizagem, elas apareceram muito superficialmente; em certos momentos pareciam até mesmo não existir; Mãe I: “(..) .......num (sic) sei.......”.Mãe II:”(...) Que eles passem de ano....... que eles cheguem numa faculdade.......fazer cursos e mais cursos......” . Esse discurso nos leva a refletir sobre a construção de uma auto-imagem negativa e ao baixo nível de aspiração que por vezes a criança deficiente apresenta, pois de acordo com AMIRALIAN:
As expectativas dos pais de uma criança divergente estão, na maioria das vezes, no nível de realização de uma criança normal, e neste sentido quaisquer realizações desta criança estão sempre aquém daquilo que é esperado [...].AMIRALIAN (1986, p. 48):
6 - CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho, que inicialmente pretendia responder a indagações que emergem da rotina do trabalho pedagógico do professor, demonstra, além dos dados aqui apresentados, que a dinâmica da vida e da sociedade, o crescimento humano e a evolução científica não podem ser mensurados; portanto, seria pretensão nossa crer que esse tema poderia se esgotar em tão singelo trabalho. Contudo, esperamos que nosso olhar pudesse contribuir para o surgimento de novas e contínuas reflexões.
Concluímos, através das entrevistas e análises subjetivas, que embora as professoras tenham interesse em envolver a família em sua prática, elas ainda não encontraram o caminho de como fazê- lo. Por outro lado, a intervenção da escola no contato com a família gera certo distanciamento entre as partes mais interessadas: professora-mãe. Também observamos que, no tocante à prática pedagógica, a formação e os recursos são elementos essenciais para viabilizar o trabalho da professora e propiciar maior e melhor desempenho do educando.
Surpriendeu-nos o fato de as mães não terem muita expectativa com relação à aprendizagem dos filhos com baixa visão. Ficamos com a impressão de que elas não acreditam na possibilidade de avanço na aprendizagem de seus filhos, embora tenham se adaptado à deficiência e lidem com isso com muita naturalidade.
Elas se contentam com o fato de seus filhos serem “independentes” nas atividades de vida diária e desconsideram a necessidade de maior envolvimento com a questão da aprendizagem, o que vem confirmar a suspeita que motivou o desenvolvimento desta pesquisa.
Podemos deduzir, pelas informações levantadas, que tanto família como professores não têm muita convicção quanto ao avanço desses alunos no tocante à aprendizagem; a primeira, talvez pela desinformação, pelo baixo nível de escolarização que apresenta e por outros inúmeros fatores, que embora sem muita influência, exercem impacto negativo sobre essa concepção; e a segunda, talvez por não perceber a necessidade de re- significar seu papel na educação e no (re) dimensionamento das relações extra e inter escolar.
Fica claro, que os modelos socioculturais da contemporaneidade influenciam as relações humanas, modificando funções sociais e valores morais, dificultando a aproximação e a ação conjunta entre a família e escola; e que ambas, parecem ter dificuldades em incorporar novos paradigmas no processo ensino/ aprendizagem e novos modelos de relacionamento (professor/aluno, professor/família, aluno/família).
Consideramos que a culminância deste trabalho não se dá ainda, e que a possibilidade de novas reflexões, voltadas ao trabalho com o deficiente visual, se fazem necessárias para que a prática pedagógica e as relações que se fazem no ambiente didático não fiquem limitadas ao espaço físico da escola.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AMIRALIAN, M.L. A dinâmica das relações familiares e problemas da excepcionalidade. In: AMIRALIAN, M.L. Psicologia do excepcional. São Paulo: EPU, 1986.
BRUNO, M.M.G.; MOTA, M.G.B. Programa de Capacitação de Recursos Humanos do Ensino Fundamental: deficiência visual vol. 1 fascículos I - II - III. Brasília, DF: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Especial, 2001.
BUSCAGLIA, L. F., Trad. MENDES, R. Os deficientes e seus pais: um desafio ao aconselhamento. 4ª ed., Rio de Janeiro: Record, 2002.
DALL’ ACQUA, M.J.C.: Intervenção no Ambiente Escolar : estimulação visual de uma criança com visão subnormal ou baixa visão - São Paulo: ed. Unesp, 2002 –(PROPP).Disponível em: http://books.google.com.br/ acessado em 18/06/10 as 22:13 hs.
DORNELES, Claunice Maria. A Contribuição das Novas Tecnologias no Processo de Ensino e Aprendizagem do Deficiente Visual. Campo Grande MS: ed. UFMS, 2007.
GODOY. ARILDA S.; Introdução à pesquisa qualitativa e suas possibilidades, In Revista de Administração de Empresas, v 35 n02 MAR/ABR 1995 a, p. 57-63
MASINI, E.F.S. Relatório Final da pesquisa A Inclusão Escolar e Estudantes Deficientes Visuais __ Avaliação das atividades da Associação Brasileira de Assistência Visual __ Laramara ao CNPq (financiadora) - em fev. de 2004.
OLIVEIRA, M. K. O pensamento de Vygotsky como fonte de reflexão sobre a educação. In: Cadernos Cedes, ano XX, nº 35, 2ª edição, Julho, 2000. p. 13.
SOIFER, R. Psicodinamismos da família com crianças. Terapia familiar com técnica de jogo. 2. ed. Petrópolis: Vozes, 1989.
UNESCO. Declaração de Salamanca. Disponível em: http://www.dhnet.org.br/direitos/sip/onu/deficiente/lex63.htm , Acesso em: 10/05/2010, às 23:13 hs.
7 ANEXOS
ANEXO 1 – MODELO DE FORMULÁRIO DE ENTREVISTA PROFESSOR
Professora:
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1
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Ele é baixa visão?
Como é a sua prática pedagógica com ele?
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2
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Você promove ações pedagógicas para envolver, chamar, trazer a família pra escola? Quais?
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3
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Com relação à participação da família?
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4
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Quando os pais vão à escola como se dá o acesso dos pais aos professores?
Nem todos os assuntos, você tem a oportunidade de tratar diretamente com a família?
Você acha que essa sua proposta de trazer o pai pra sala pra assistir aula junto, não surtiu muito efeito na sua prática?
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5
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Qual seria, em sua opinião o ambiente ideal de aprendizagem para uma criança com baixa visão?
Com relação ao material de apoio, esse aluno ele ocupa algum aparato, algum material específico pra deficiência dele na sua sala de aula?
Obrigada por sua contribuição!
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ANEXO 2 – MODELO DE FORMULÁRIO DE ENTREVISTA DA FAMÍLIA:
MÃE:
FILHO:
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1
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Fale um pouco de você, tá.... pra eu te conhecer .... melhor um pouquinho, tá bom?
Você é casada?
Quando você percebeu que ele tinha deficiência visual?
Quando isso aconteceu, ele tinha quantos anos de idade? Quanto tempo faz isso?
E hoje quantos anos ele tem?
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2
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Como é ter uma criança com deficiência visual? Como você lida com isso?
Você sabe conceituar a deficiência que ele tem? Como você define ou como o médico definiu pra você?
E você sabe como se define uma pessoa que tem essa acuidade visual?
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3
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Qual foi a sua reação? O que você sentiu a princípio quando você percebeu que ele tinha dificuldade pra enxergar?
Como é o desempenho dele na escola? Você acompanha isso, você vai lá dar um apoio, perguntar, como é que acontece essa sua relação com a escola?
Ele traz atividades pra fazer em casa?
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4
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Como é o comportamento de seu filho com os outros filhos? Ele tem alguma dependência?
Você sabe o nome da professora dele?
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5
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Como ele se relaciona com as outras pessoas da família?
Não tem dificuldade nenhuma?
Com relação aos amiguinhos, ele enfrenta alguma barreira, alguma dificuldade com os amiguinhos?
Não se acha diferente?
Muito obrigada por sua contribuição.
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[1] Artigo apresentado ao Curso de Pós-graduação Lato Sensu em Educação Especial, na Perspectiva da Educação Inclusiva, da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul – UEMS, como exigência para a obtenção do título de Especialista em Educação Especial.
[5] O termo normovisual refere- se à pessoa dotada de visão com ou sem auxilio óptico, em contraste com os deficientes visuais cegos e de baixa visão. (MARTÍM, M.B.;BUENO, S.T. Deficiência visual e acção educativa. In: BAUTISTA, R. Necessidades educativas especiais. Lisboa. Dina Livro, (1997. p. 324-347,apud DORNELES,M.C., A contribuição das novas tecnologias no processo de ensino e aprendizagem do deficiente visual (2007. p. 17-124).
[6] Salas de recursos multifuncionais são ambientes dotados de equipamentos mobiliários e materiais didáticos e pedagógicos específicos para a oferta do atendimento educacional especializado. (Decreto nº 6571,2008. Art.60 LDB/96).